quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Georg & Brenda Feuerstein e o Yoga Verde



Por Georg & Brenda Feuerstein

[Tradução adaptada do artigo “What is Green Yoga” publicada na revista Prana Yoga Journal, n. 17, pág. 54. Este texto se encontra inserido no artigo “Prática Consciente”, de Patrícia Ribeiro.]


Em nosso livro Green Yoga [Yoga Verde] apontamos que o Yoga tradicional é inerentemente verde, ou seja, ecologicamente correto. Por que, então, falamos especificamente de Yoga Verde? A resposta é óbvia: porque muito do Yoga contemporâneo é tudo menos verde. Como parte da sociedade consumista, ele é tratado como commodity [bem consumível, mercadoria ou conveniência] e representa a mentalidade que o Yoga Verde critica e busca superar.

Compreendemos que poucos adeptos do Yoga contemporâneo têm, até agora, descoberto os ensinamentos morais e espirituais do Yoga além do encantamento das posturas físicas.

Entretanto, poderíamos ser injustos por pensar que eles não mudariam no futuro. O Yoga tem seu poder próprio, e não são poucas as pessoas que têm gradualmente mudado da mera prática de posturas para um comprometimento profundo da moralidade do Yoga e da espiritualidade. Mesmo os “posturistas” radicais são potencialmente capazes de encontrar seu caminho na moral do Yoga e na sabedoria espiritual, e desse modo prestar atenção na profunda relevância ambiental. De fato, se eles considerassem o problema da poluição – uma preocupação central do ambientalismo –, poderiam compreender que a aspiração para se atingir a saúde física não pode acontecer se o ar, a água e a terra estiverem poluídos. Apenas da perspectiva puramente física , esses praticantes deveriam abraçar o movimento de Yoga Verde por um ambiente mais saudável.

A definição de saúde só na forma física é muito limitada. Para uma definição mais ampla, devemos também considerar o bem-estar mental e espiritual. Afinal, não somos somente corpos, mas mentes abrangentes com acesso ao que alguns psicólogos chamam de estados ou realidades “transpessoais” (espirituais). Da perspectiva yogī, a saúde é um tipo de totalidade que vem quando descobrimos a nossa natureza ou verdade espiritual. Esse tipo de totalidade sempre fugirá de nós enquanto nos identificarmos com o corpo e a mente como se fossem coisas independentes.

Desse modo, nosso argumento vai além da preocupação com o bem-estar material. A devastação ambiental que testemunhamos hoje é, para nós, primordialmente uma questão moral, por duas razões: primeiro, nós, humanos, somos a principal causa.

Segundo, nosso estilo de vida é fonte de sofrimento infinito para inúmeros seres, que não são capazes de corrigir o fardo que pesa sobre eles. Esses seres são as vítimas principais da destruição que pode ainda ser nossa própria causa de destruição. A menos que nós mudemos nossas escolhas, a repercussão de um estilo de vida impensado inevitavelmente conduzirá a destruição de toda biosfera.

Temos de mudar nossas prioridades – valores, filosofia, atitudes e comportamentos. Para os praticantes de Yoga isso significa fazer a nossa prática de Yoga rigorosamente verde. O Yoga Verde é o Yoga praticado com responsabilidade e espiritualidade, com atenção aos valores morais universais e espirituais promovidos no Yoga tradicional.

A menos que nos sintamos tão tocados, não precisamos adotar as doutrinas religiosas e símbolos do Yoga tradicional como o hinduísmo, budismo e jainismo. Esses são exemplos de doutrinas condicionadas à crença da existência de Kṛṣṇa, Śiva ou outra deidade, e também a crença metafísica de que o espírito e a matéria estão eternamente em posições antagônicas; que há exatamente sete centros sutis (cakras) e 72 mil canais sutis (nāḍīs) no corpo, ou que seres sensíveis são objeto de reencarnação. Além disso, há uma crença não universal, por exemplo, de que alguém pode ganhar a liberação recitando a Bhagavadgītā ou outra escritura sagrada; de que a postura de lótus acaba com todas as doenças.

Quando falamos em valores universais, nos referimos ao discernimento fundamental na condição humana e nos comportamos baseados neles – obviamente que não fazer o mal é melhor que fazer o mal, que a verdade é melhor que a mentira, não roubar é melhor que roubar, compaixão é melhor que desumanidade, amor é melhor que ódio, perdão é melhor que vingança e outros.

Um valor universal é também a admissão da existência de estados transpessoais e processos e o fato de que nós, humanos, somos capazes de autotranscendência e autotransformação, como também de realizações transpessoais pelo treinamento da mente. O Yoga Verde defende estes axiomas fundamentais do Yoga tradicional.

O Yoga Verde tem dois pilares éticos:

1. o centro ideal do karma-yoga (o caminho da ação autotranscendental);
2. o māhāyana budista ideal de bodhisattva, o praticante que está comprometido com o autruísmo espiritual, com a mente focada na libertação de todos os seres.

Esses dois ideais – um da tradição hindu, outro do budismo – comunicam reverência por todas as vidas e a disciplina de atenção. É pelo cultivo da atenção que nos tornamos totalmente conscientes do valor intrínseco de todos os seres sensíveis. É pela reverência pela vida que nossa prática de atenção se torna verdadeiramente relevante no aqui e no agora. Atenção e reverência se relacionam como a cabeça se relaciona com o coração.

Quando realmente enxergamos o prejuízo catastrófico que fazemos com o meio ambiente, nossa única escolha moral será mudar. Hoje, viver nosso Yoga significa que devemos viver sustentavelmente, tendo em mente que o meio ambiente é para as futuras gerações de todos os seres vivos. O Yoga Verde é uma oportunidade de prática do Yoga tradicional no contexto da crise contemporânea do planeta para tornar a Terra um lugar bom para se viver.

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