quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Descobrindo a Meditação



Por Fernando Liguori


[Texto retirado da apostila do Módulo I da Oficina de Meditação, edição 2010, ministrada pelo Instituto Kaula. Este satsanga foi realizado no anfiteatro da Escola de Música Pró-Música, ministrado pelo Instituto Kaula em 13 de novembro de 2009.]


Na medida em que experimentamos este nível profundo
de meditação, descobrimos que a natureza da mente
é meditação e que isso, por si mesmo, é uma
experiência iluminadora.

Swami Niranjanananda Saraswati


Quase todas as disciplinas espirituais praticam alguma forma de meditação. Ordinariamente, a meditação é tida como uma forma de pensamento combinado com palavras, imagens ou conceitos. Mas a meditação não é pensar sobre alguma coisa. A experiência meditativa pode parecer bem subjetiva – minha consciência, meu estado de alerta. Entretanto, quando observamos o processo meditativo com mais profundidade, descobrimos que a consciência não é nem subjetiva e nem objetiva; da mesma maneira, ela não pode ser analisada conceitualmente. Consciência é um estado de abertura que ocorre quando a mente é deixada funcionar a sua própria maneira, sem interrupções, distrações ou expectativas.

A consciência meditativa é como um espaço completamente vazio. Mas não o espaço como nós comumente entendemos, pois a consciência não é um lugar e não possui uma forma particular. Este espaço não está dentro ou fora do corpo. Não é mental ou físico e ainda, ao mesmo tempo, é um sentido profundo e integrado de estabilidade, franqueza, sinceridade e equilíbrio – que é a experiência da meditação em si mesma.

Tradicionalmente, o início da meditação envolve certas práticas tais como dhāraṇā (concentração), visualização de imagens, entoação de mantras etc. Os professores enfatizam a necessidade de técnicas diferentes, dependendo das necessidades dos praticantes. Por exemplo, um professor pode pedir a um estudante para ir sozinho a um lugar quieto e permanecer ali completamente em silêncio por meia hora ou vinte e cinco minutos. Da mesma maneira, ele pode pedir a outro estudante que vá as montanhas e lá entoe mantras em voz alta. Outro estudante pode ser instruído em fixar seu olhar na chama de uma vela mantendo os olhos o tempo todo abertos.

Geralmente, acima de tudo, nossa prática deve promover a calma e o relaxamento como bases fundamentais ao desenvolvimento da estabilidade e concentração. A meditação nos ensina a sermos calmos e felizes, aproveitando a vida em sua plenitude, com satisfação e o mais importante, auxilia no gerenciamento das faculdades mentais para que efetivamente possamos lidar com os problemas tanto físicos quanto emocionais ou mentais com equilíbrio e equanimidade. Nossa vida se torna equilibrada quando somos capazes de integrar qualquer experiência da vida com a prática meditativa. Podemos incluir em nossa prática o regozijo e a felicidade, bem como a fúria, o ressentimento, a frustração e a infelicidade, todas as emoções que sentimos dia-a-dia. Podemos transformar todas as nossas emoções em uma prática meditativa calma e relaxada.

No início, a meditação parece algo simples: aquiete seus ares internos, mantenha-se calmo, imóvel, relaxado etc., seguindo alguma instrução específica. Contudo, na medida em que refinamos o processo meditativo, percebemos que a meditação envolve muito mais do que apenas relaxar e lidar com seus pensamentos e emoções. A Meditação é um processo de busca pela verdade ou pelo entendimento, é a tentativa de descobrir a natureza da existência e da mente humana. Para obtermos tal conhecimento precisamos mergulhar profundamente na meditação para descobrirmos o que somos de verdade.

Mas como você medita? Primeiro, o corpo deve estar imóvel, estável, aquietado. Fisicamente, você deve relaxar seus músculos e se desprender de todas as tensões. Sua postura deve ser confortável para que permaneça imóvel, sem se mexer em hipótese alguma. A respiração deve ser gentil, suave. Inspire e expire suavemente. Na medida em que você relaxa mais o corpo, a respiração, mente e emoções, o sistema nervoso vai se aquietando também, naturalmente. Com o sistema nervoso calmo e tranquilo, a mente torna-se calma e tranquila, a corrente de pensamentos cessa e você experimenta o silêncio interior. Existem várias maneiras de se atingir este estado, mas para não se perder no mundo destas instruções, apenas relaxe naturalmente seu corpo, respiração e mente. Assim, o corpo torna-se firme e imóvel, a respiração equilibrada e a mente e os sentidos em paz. Neste momento você será capaz de sentir seus sentidos aflorarem completamente. Nesse caminho notará que a meditação não é uma tarefa complicada ou algo exótico, importado de outra terra, mas ao contrário, ela é parte de nossa natureza.

Não existe a necessidade de se tentar chegar a algum lugar, atingir alguma meta. Essa tentativa pode se tornar frustrante ao perceber que ela se tornou um obstáculo ao processo do relaxamento. Punir a si mesmo ou a tentativa de seguir um conjunto rígido de instruções pode causar problemas, pois quando existe esforço em demasia e nenhum resultado é obtido – ou pelo menos percebido – cria-se expectativas internas, o que atrapalha na condução do silêncio interior. Quando você tenta conceitualizar a experiência da «meditação perfeita», o resultado é a criação de um estado sem fim de conflito e diálogo interno.

Por conta dos conceitos serem necessários nos estágios iniciais da meditação, desde o início, o praticante é separado da experiência. Mas com o tempo, na medida em que ele se envolve com os processos meditativos, descobre que a meditação vai muito além de qualquer conceitualização. Se ele continuar relaxando e acalmando sua mente, eventualmente nenhum esforço será necessário para praticar a meditação.

Quando você está aprendendo a meditar, o melhor é partir sempre de si mesmo, experienciar a si mesmo, em toda sua totalidade, sem rejeitar ou excluir qualquer parte de si. Todos os seus sentimentos e pensamentos podem fazer parte de sua meditação, você pode experimentar cada um a sua maneira e quando estiver preparado, siga em frente, deixando-os de lado. Neste caminho, você pode começar a descobrir os vários níveis sutis e estados da mente. A mente simplesmente observa seu processo natural; cada pensamento, desejo e motivação se torna um apoio natural a este tipo de meditação. Em certo nível, haverá a distinção entre aspectos negativos e positivos, mas na medita em que o processo meditativo se aprofunda, você não mais perceberá essa discriminação relativa, se preparando para experiências mais refinadas. A meditação transcende o dualismo. Tudo o que você experiencia pode ser visto como perfeito, pois a qualidade da perfeição reside na mente e não nas coisas externas.

Quando memórias desconfortáveis aparecem, a tranquilidade é abalada, mas essa sensação passa se um estado de alerta total, um estado de consciência plena estiver sendo exercido, pois nele é impossível se apegar a qualquer pensamento seja lá sua natureza. É importante permanecer em um estado relaxado e quieto sem pensar «o que é a meditação?» ou «será que estou meditando?» Simplesmente aceite a si mesmo. Você não está tentando aprender a meditação, você é a meditação. Todo o seu corpo, respiração, pensamentos, sentidos e consciência, todo seu ser... tudo é meditação. Não se preocupe em estar perdido. Tudo em você, todo seu campo energético é meditação. Assim, com o tempo o praticante descobre que não é necessário seguir nenhuma instrução ou se preocupar em atingir qualquer experiência.

Swami Niranjan certa vez disse que «na medida em que experimentamos este nível profundo de meditação, descobrimos que a natureza da mente é meditação e que isso, por si mesmo, é uma experiência iluminadora.» Essa experiência é livre de tudo e ao mesmo tempo se manifesta em tudo. Isso, em si mesmo, é a liberação.


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