Por Fernando Liguori
[Texto retirado da apostila do Módulo I
da Oficina de Meditação, edição 2010, ministrada pelo Instituto Kaula.
Este satsanga foi realizado no anfiteatro da Escola de Música
Pró-Música, ministrado pelo Instituto Kaula em 13 de novembro de 2009.]
Na medida em que experimentamos este
nível profundo
de meditação, descobrimos que a
natureza da mente
é meditação e que isso, por si mesmo, é
uma
experiência iluminadora.
Swami Niranjanananda Saraswati
Quase todas as disciplinas espirituais praticam alguma forma de meditação.
Ordinariamente, a meditação é tida como uma forma de pensamento combinado com
palavras, imagens ou conceitos. Mas a meditação não é pensar sobre alguma
coisa. A experiência meditativa pode parecer bem subjetiva – minha
consciência, meu estado de alerta. Entretanto, quando observamos o
processo meditativo com mais profundidade, descobrimos que a consciência não é nem
subjetiva e nem objetiva; da mesma maneira, ela não pode ser analisada
conceitualmente. Consciência é um estado de abertura que ocorre quando a
mente é deixada funcionar a sua própria maneira, sem interrupções, distrações
ou expectativas.
A consciência meditativa é como um espaço completamente vazio. Mas não o
espaço como nós comumente entendemos, pois a consciência não é um lugar e não
possui uma forma particular. Este espaço não está dentro ou fora do corpo. Não
é mental ou físico e ainda, ao mesmo tempo, é um sentido profundo e
integrado de estabilidade, franqueza, sinceridade e equilíbrio – que é a
experiência da meditação em si mesma.
Tradicionalmente, o início da meditação envolve certas práticas tais como dhāraṇā
(concentração), visualização de imagens, entoação de mantras etc. Os
professores enfatizam a necessidade de técnicas diferentes, dependendo das
necessidades dos praticantes. Por exemplo, um professor pode pedir a um
estudante para ir sozinho a um lugar quieto e permanecer ali completamente em
silêncio por meia hora ou vinte e cinco minutos. Da mesma maneira, ele pode
pedir a outro estudante que vá as montanhas e lá entoe mantras em voz
alta. Outro estudante pode ser instruído em fixar seu olhar na chama de uma
vela mantendo os olhos o tempo todo abertos.
Geralmente, acima de tudo, nossa prática deve promover a calma e o
relaxamento como bases fundamentais ao desenvolvimento da estabilidade e
concentração. A meditação nos ensina a sermos calmos e felizes, aproveitando a
vida em sua plenitude, com satisfação e o mais importante, auxilia no
gerenciamento das faculdades mentais para que efetivamente possamos lidar com
os problemas tanto físicos quanto emocionais ou mentais com equilíbrio e
equanimidade. Nossa vida se torna equilibrada quando somos capazes de
integrar qualquer experiência da vida com a prática meditativa. Podemos
incluir em nossa prática o regozijo e a felicidade, bem como a fúria, o
ressentimento, a frustração e a infelicidade, todas as emoções que sentimos
dia-a-dia. Podemos transformar todas as nossas emoções em uma prática
meditativa calma e relaxada.
No início, a meditação parece algo simples: aquiete seus ares internos,
mantenha-se calmo, imóvel, relaxado etc., seguindo alguma instrução específica.
Contudo, na medida em que refinamos o processo meditativo, percebemos que a
meditação envolve muito mais do que apenas relaxar e lidar com seus pensamentos
e emoções. A Meditação é um processo de busca pela verdade ou pelo
entendimento, é a tentativa de descobrir a natureza da existência e da mente
humana. Para obtermos tal conhecimento precisamos mergulhar profundamente
na meditação para descobrirmos o que somos de verdade.
Mas como você medita? Primeiro, o corpo deve estar imóvel, estável,
aquietado. Fisicamente, você deve relaxar seus músculos e se desprender de
todas as tensões. Sua postura deve ser confortável para que permaneça imóvel,
sem se mexer em hipótese alguma. A respiração deve ser gentil, suave. Inspire e
expire suavemente. Na medida em que você relaxa mais o corpo, a respiração,
mente e emoções, o sistema nervoso vai se aquietando também, naturalmente. Com
o sistema nervoso calmo e tranquilo, a mente torna-se calma e tranquila, a
corrente de pensamentos cessa e você experimenta o silêncio interior. Existem
várias maneiras de se atingir este estado, mas para não se perder no mundo
destas instruções, apenas relaxe naturalmente seu corpo, respiração e mente.
Assim, o corpo torna-se firme e imóvel, a respiração equilibrada e a mente e os
sentidos em paz. Neste momento você será capaz de sentir seus sentidos
aflorarem completamente. Nesse caminho notará que a meditação não é uma tarefa
complicada ou algo exótico, importado de outra terra, mas ao contrário, ela é
parte de nossa natureza.
Não existe a necessidade de se tentar chegar a algum lugar, atingir alguma
meta. Essa tentativa pode se tornar frustrante ao perceber que ela se tornou um
obstáculo ao processo do relaxamento. Punir a si mesmo ou a tentativa de seguir
um conjunto rígido de instruções pode causar problemas, pois quando existe
esforço em demasia e nenhum resultado é obtido – ou pelo menos percebido –
cria-se expectativas internas, o que atrapalha na condução do silêncio
interior. Quando você tenta conceitualizar a experiência da «meditação
perfeita», o resultado é a criação de um estado sem fim de conflito e diálogo
interno.
Por conta dos conceitos serem necessários nos estágios iniciais da
meditação, desde o início, o praticante é separado da experiência. Mas com o
tempo, na medida em que ele se envolve com os processos meditativos, descobre
que a meditação vai muito além de qualquer conceitualização. Se ele continuar
relaxando e acalmando sua mente, eventualmente nenhum esforço será necessário
para praticar a meditação.
Quando você está aprendendo a meditar, o melhor é partir sempre de si
mesmo, experienciar a si mesmo, em toda sua totalidade, sem rejeitar ou excluir
qualquer parte de si. Todos os seus sentimentos e pensamentos podem fazer
parte de sua meditação, você pode experimentar cada um a sua maneira e
quando estiver preparado, siga em frente, deixando-os de lado. Neste caminho, você
pode começar a descobrir os vários níveis sutis e estados da mente. A mente
simplesmente observa seu processo natural; cada pensamento, desejo e motivação
se torna um apoio natural a este tipo de meditação. Em certo nível, haverá
a distinção entre aspectos negativos e positivos, mas na medita em que o
processo meditativo se aprofunda, você não mais perceberá essa discriminação
relativa, se preparando para experiências mais refinadas. A meditação
transcende o dualismo. Tudo o que você experiencia pode ser visto como
perfeito, pois a qualidade da perfeição reside na mente e não nas coisas
externas.
Quando memórias desconfortáveis aparecem, a tranquilidade é abalada, mas
essa sensação passa se um estado de alerta total, um estado de consciência
plena estiver sendo exercido, pois nele é impossível se apegar a qualquer
pensamento seja lá sua natureza. É importante permanecer em um estado relaxado
e quieto sem pensar «o que é a meditação?» ou «será que estou meditando?» Simplesmente
aceite a si mesmo. Você não está tentando aprender a meditação, você
é a meditação. Todo o seu corpo, respiração, pensamentos, sentidos e
consciência, todo seu ser... tudo é meditação. Não se preocupe em estar
perdido. Tudo em você, todo seu campo energético é meditação. Assim, com o
tempo o praticante descobre que não é necessário seguir nenhuma instrução ou se
preocupar em atingir qualquer experiência.
Swami Niranjan certa vez disse que «na medida em que experimentamos este
nível profundo de meditação, descobrimos que a natureza da mente é meditação e
que isso, por si mesmo, é uma experiência iluminadora.» Essa experiência é
livre de tudo e ao mesmo tempo se manifesta em tudo. Isso, em si mesmo, é a
liberação.
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